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Sobre o espírito de um relógio cuco_uma reflexão acerca do luto e da reparação a partir do pensamento benjaminiano

Dissertation : Sobre o espírito de um relógio cuco_uma reflexão acerca do luto e da reparação a partir do pensamento benjaminiano. Recherche parmi 300 000+ dissertations

Par   •  1 Septembre 2016  •  Dissertation  •  947 Mots (4 Pages)  •  1 021 Vues

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Poema Suspenso para uma Cidade em Queda - CIA. MUNGUNZÁ DE TEATRO

crítica escrita em 13 de julho de 2016.

[pic 1]Quando tudo ao redor parece ruir enquanto o corpo permanece misteriosamente suspenso na queda. A inacabada queda, súbita e imprevisível, é a chave de partida da complexa e a todo tempo surpreendente dramaturgia de “Poema suspenso para uma cidade em queda”. Título este que se integra à dramaturgia e abre o espetáculo (na voz de um dos atores), prestando-se, desse modo, a uma interessante antecipação de metáforas que serão determinantes à dinâmica desse envolvente trabalho do grupo Mungunzá. Tudo em “Poema suspenso...” tem a elevação dramática do trágico e a profundidade crítica da queda. Adotando uma dramaturgia que desde o primeiro instante flerta com a metalinguagem e faz uso de inesperadas quebras da quarta parede, o corpo em trânsito é colocado em vários momentos sob a eminência da queda, atualizando no espaço cênico a esteira movente sob a qual os dramas se aprofundam em abismo.

Abismo este, ou vão crescente que se impõe ao corpo em queda, não dado de imediato ao espectador, mas construído com vigoroso esforço, suor, lágrimas e sangue pelas personagens, residentes de um fatídico prédio decadente. Chamados à cena pelo grito abafado do corpo em queda, as personagens passam a encenar a angustiante expectativa do fim. Habitando os vãos cúbicos de um monumental andaime sobre rodas, um homem recente a ausência do pai, expulso de casa quando aquele ainda era criança; uma mulher grávida lê o abandono e a solidão nas cartas que recebe sempre sob um forte impacto; outra, mais velha e também grávida, enfaixa o ventre para impedir o nascimento do filho, e que misteriosamente jamais nasce, mesmo depois de décadas, como se sua concepção também permanecesse suspensa; em outro andar, um homem cuida de bebês abandonados sobre os umbrais de sua janela, enquanto uma mulher, jovem e solitária, convive com um personagem de pelúcia e costuma fingir ser outra pessoa, cuja vida social ativa é dada pela interação com outras pessoas apenas conectadas virtualmente. Durante o espetáculo, é comovente perceber como estes diferentes universos imaginários, criados, habitados e às vezes compartilhados entre as personagens, em vários instantes parecem se harmonizar por meio de belos arranjos musicais, que ora suave, ora em quase desvario, reverberam sobre uma atmosfera de cores e melancolias, pondo-se como componente dramático nascido de dentro da cena, a partir dos esforços e sentimentos de seus encenadores, construindo deste modo uma sentimental melodia executada pelas próprias personagens e suas angústias particulares.

“Poema suspenso para uma cidade em queda” realiza-se sob uma dramaturgia complexa e dinâmica, sem jamais deixar de ser coerente e repleta de energia criativa, características fundamentais ao êxito de um grande espetáculo. O curioso é notar que tais qualidades não são apenas conquistas de um grupo teatral maduro, mas aqui se tornam componentes inerentes e fundamentais ao argumento central que sustenta toda dramaturgia. O corpo em queda, antes de tudo, é persona cênica que permeia todos os andares do cenário e todas as cenas da peça, iluminando-as e escurecendo-as, como se insuflasse nelas o sopro vital da ação cênica e determinasse uma interrupção significativa em seus cursos, deixando ecoar no escuro as últimas palavras de pequenos monólogos, para que estes ganhem mais densidade enquanto se verticalizam em outro tipo de queda. Um dos trunfos do espetáculo dirigido por Luiz Fernando Marques é esta incorporação dramática do próprio ato de iluminação cênica, cujos simbolismos vão além das paletas de cores vibrantes e criativas. Passando pelas mãos hábeis de um corpo em queda, a violência e agonia do vermelho, do alaranjado e do amarelo, justapõem-se à frieza dos tons de azul, violeta e verde, que iluminam no palco os interiores solitários, melancólicos e, por vezes, desesperadamente esperançosos das personagens, as quais buscam com insistência o adiamento do choque final, provável legado da morte que, ao contrário do próprio vazio instaurado na consciência infinitamente reiterada da queda, resiste a acontecer.

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